APROVADOS

Agente da Polícia Federal, 2015, Maria Carolina.

“Não sei se eu ganhei um presente ou se dei um presente pra ele. Por um minuto todos os atrasos no resultado fizeram sentido. Se não fosse ele contando desde que eu nasci sobre a PF, mostrando o distintivo e falando do trabalho dos agentes, eu talvez mal soubesse que função era essa.”

Depoimento emocionado de Maria Carolina

A vontade de ser agente veio de família, meu avô era agente de telecomunicações da PF e também trabalhava na extinta Varig. Lembro dele falar sobre os agentes da PF e essa ser a primeira vez que tomei conhecimento do que era concurso público. O que me chamava a atenção era o serviço em si, as responsabilidades. Ao mesmo tempo, pra mim que tinha cerca de 8 anos de idade, lembro de como a prova parecia ser difícil e eu não me imaginava me dedicando pra ela. Mas a ideia foi plantada, ficou ali, como eu precisaria ser formada, ter CNH, era algo tão distante.

A universidade federal foi meu primeiro contato com uma entidade publica. Até então eu estudei em colégio particular, tinha plano de saúde e como uma adolescente, pouco usava qualquer serviço público. Acontece que eu simplesmente amei. Era incrível estar em um local público onde apesar de muitos problemas, tudo funcionava e o ensino era de muita qualidade. Cresci ouvindo que, o que era público era velho, ruim, escaquiado, ineficiente e a UFGRS não era nada disso. Eu via gente fazendo milagre mesmo com menos infraestrutura, gente boa de verdade. Eu via também gente de baixa renda com bolsa, morando na casa dos estudantes, almoçando no RU, tendo oportunidade de estar ali e usufruir o mesmo que eu, que havia estudado no colégio particular e feito cursinho. Chegava a ser feio da minha parte achar que eu tinha muito mérito por estar ali quando tive todas as condições favoráveis pra isso. O único “porém” é que a medida que o tempo passava e eu admirava mais a universidade, eu gosta menos do meu curso, não pelo curso em si, mas pela prática profissional.

No fim tudo se resumia em fazer coisas legais, mas que se não vendessem, ou seja, não gerassem lucro para uma empresa, eram apenas uma utopia e eu não gostava daquilo. Isso era evidente em todos os estágios que eu fazia, no fim das contas o projeto é como o cliente quer porque ele que paga, mesmo sendo um projeto ruim. Sem contar que a exploração e a prática de burlar as leis trabalhistas eram extremamente comuns na minha profissão.

Foi então que comecei um estágio no Tribunal de Justiça, no setor de arquitetura e engenharia. O trabalho era ótimo, nós éramos estagiários tratados como estagiários e não mão de obra barata. O salário era pago sempre conforme calendário e nenhum centavo a menos. Claro que havia vários problemas também, mas era de longe o local mais justo e que eu melhor me senti pra trabalhar. Eu lembro que eles não pagavam a mais se tu fizesse mais de 30 horas semanais, mas eu cansei de ficar mais tempo pra ajudar minha chefe, não era obrigação, era um prazer. Essa experiência só afirmou minha admiração pelo setor público e foi quando eu comecei a me convencer que eu queria era trabalhar pro estado.  Logo que meu estagio estava chegando no fim, abriu um concurso pra servidor no TJ e como era a única forma de continuar lá, eu resolvi encarar. Comprei um EAD, fiz um presencial de resolução de questões e consegui fazer os mínimos, fui “aprovada”, mas minha classificação foi ruim.

Como não ia ser chamada, deixei por isso mesmo e continuei minha vida. Me formei, fui trabalhar com design, mas obviamente eu já não queria mais aquela vida pra mim. Naquele mesmo ano meu avô faleceu e eu comecei a pensar na minha vida, em quem eu queria ser, o que eu realmente queria fazer da minha vida e se eu estava de alguma forma contribuindo pra alcançar isso. Então em outubro daquele primeiro ano de designer, 2013, pedi demissão. Foi aí que o universo começou a conspirar a meu favor. No dia seguinte da minha demissão uma amiga (ex-colega do TJ) me convidou pra trabalhar com ela. Eram uns trabalhos de freelancer, esporádicos, eu ia poder fazer a hora que quisesse, conciliar com meus estudos e ainda ter um dinheiro. Além disso, naquele mesmo mês saiu o edital pra agente administrativo da PF, ou seja, mais um “sinal” que o universo conspirava ao meu favor. Aquela prova veio me lembrar daquela ideia antiga de agente da PF. Agora eu era formada, tinha ensino superior, tinha CNH, saí do meu emprego, eu não tinha mais desculpa, a não ser não querer pagar o preço que seriam os anos de estudo. Foi então que resolvi encarar.

Inscrevi-me no de agente administrativo mesmo sabendo que não era bem aquilo que eu queria e comecei minha caminhada. Fiz outros concursos, mas sempre da CESPE/UnB e sempre pensando no quanto contribuiria pro meu estudo pra agente. Em março de 2014 saiu a autorização pro concurso de Agente da Polícia Federal e aí era minha chance real. Estudei o máximo que pude, fiz cursinho me matriculei em aula de natação, fiz aulas de corrida sempre pensando em todas as etapas. Assinei os simulados do Missão Papa Fox que foram essenciais pra minha aprovação. Um trabalho muito sério, um fórum muito bem organizado e orientado onde tirava minhas dúvidas e conseguia, através dos simulados e discussões, fixar a matéria que eu estudava nas aulas EAD e tirar dúvidas que muitas vezes eu não conseguia sanar com as aulas. A prova objetiva foi dia 21 de dezembro e eu me lembro de ter saído dela tranquila, com a certeza de que fiz o melhor que pude ainda mais pensando que foi meu primeiro concurso nacional no qual me dediquei 100%. Para a minha felicidade depois do gabarito oficial eu havia feito 74 pontos e 11,25 (de 13,00) na redação, um score que eu nunca teria imaginado nem nos meus pensamentos mais otimistas. Passada a felicidade, passei a me dedicar exclusivamente pro TAF, principalmente na natação que era meu ponto fraco. Felizmente passei em todas as provas e consegui somar 18 pontos. Depois vieram a etapa dos exames médicos, pra mim a pior de todas por ser extremamente detalhista e chata, e o psicotécnico que era também extremamente cansativo. Felizmente tudo ocorreu como o esperado e após dois adiamentos do resultado final, dia 16 de julho de 2015 foi o dia da minha convocação, mesmo dia em que meu avô – Agente aposentado da Polícia Federal – completaria 86 anos de idade.

Não sei se eu ganhei um presente ou se dei um presente pra ele. Por um minuto todos os atrasos no resultado fizeram sentido. Se não fosse ele contando desde que eu nasci sobre a PF, mostrando o distintivo e falando do trabalho dos agentes, eu talvez mal soubesse que função era essa. Eu não teria, com 8 anos de idade, dito pra mim e pra ele: essa é uma profissão que eu gostaria de ter, mesmo ele falando da prova concorrida e do temido teste físico. Era impossível desvincular dele essa escolha e aí veio o dia da convocação no dia do aniversário dele.

Mais do que uma profissão, ser Agente da Polícia Federal é pra mim a minha escolha de vida que envolve minha visão de mundo, quem eu sou, quem eu quero ser e as minhas memórias de família. Ao pensar em toda essa trajetória o único sentimento que talvez descreva tudo que aconteceu seja: felicidade.