LEI E HONRA: VALORES DA JUSTIÇA
– por Sinval Batista*
Que legitimidade um agente do estado tem ao tentar fazer justiça sem estar amparado pela legislação, honra e ética? Nenhuma. É o que mais se vê. Em certos cenários, você estuda muito para atingir um patamar que lhe permita promover justiça, mas vislumbra duas alternativas: a falta de aparato para combater o crime corretamente; ou a não atuação, enquanto assiste os classificados como guerreiros atropelando a moral em prol de uma pseudo ordem.
Particularmente, sou fã do Justiceiro e do que ele representa nas histórias de heróis. Paradoxalmente, também sou fã do Batman, que, ao contrário do primeiro, não acredita no derramamento de sangue como meio para a justiça. Descobri que gosto dos dois porque talvez eu seja indiferente aos meios utilizados pelos personagens. Preso pela moral e honra, e isso ambos tem, apesar dos métodos variáveis de cada um.
Contudo, isso é na ficção. Na vida real, a maioria dos métodos alternativos incorre em uma cascata de acontecimentos que perturbam a ordem social, gerando, inclusive, guerra civil. Exemplo disso é a situação da segurança pública no Rio de Janeiro e Belém. Concordo que a legislação brasileira é frágil, a Justiça é lenta e falha, mas parte da ineficácia da segurança pública está em como os policiais enxergam a polícia.
Transferem para a Justiça a responsabilidade de indivíduos perigosos estarem livres, ignorando a falha na instrução criminal para produção de provas robustas que é o que os manteriam presos. É a máxima “A polícia prende e a Justiça solta”. Mas em grande parte dos lugares a delegacia de polícia se resume apenas a flagrantes e registro de ocorrências. O resultado disso é que grandes criminosos, como chefes de organizações criminosas, assaltantes de bancos, dentre outros, são detidos em um flagrante por porte ilegal de arma, por exemplo.
A partir disso, para suprir todo esse sistema falho, ignorando, principalmente, a necessidade de um novo modelo de polícia, o investimento em tecnologia, a utilização da Inteligência Policial, e o foco na produção de provas, os agentes da segurança deixam de ser policias e tornam-se soldados. Porém, ao contrário do Justiceiro e do mundo imaginário, os interesses pessoais se exaltam ao se verem apoiados no manto das instituições armadas, revelando grupos de extermínio, homicidas mediante recompensa, forjadores de flagrante, invasores de domicílio, praticantes de corrupção passiva e extorsões, milicianos. Enfim, todo tipo de vantagem indevida que se aproveita da sensação de justiça feita com as próprias mãos. Afinal, isso é mais fácil e rentável que trabalhar provas em uma investigação e receber o salário de um policial.
Neste contexto, percebe-se também que surge a relativização de que uns crimes devem ser combatidos (os praticados pela escória da sociedade) enquanto outros são uma mera consequência de um sistema imperfeito que, por isso, devem ser relevados (os praticados por representantes dos órgãos públicos). O irônico é que, não raro, estes aparecem em televisão, campanhas, audiências públicas, e outros, para debaterem a criminalidade da região e pensarem em alternativas para redução dos índices. Hipocrisia! Ao selecionarem os crimes que repudiam ou participarem dos que ignoram, não emanam esforços para a atuação sem segregação. Assim, colecionam ações sem valor moral para a comunidade, pois não há honra em atender interesse de uns grupos ou explorar a condição desfavorecida de outros. É dessa quebra de convenções éticas da sociedade que brota a falta de respeito à autoridade policial, alimentando cada vez mais a briga entre polícia e ladrão: represálias, ameaças, retaliações.
Portanto, a honra e valores éticos devem estar intimamente ligados à aplicação da Lei para a verdadeira promoção de Justiça. Apenas assim se alcançará a ordem, como um meio para a paz, e não como objeto do medo. Entretanto, infelizmente, ser honesto e combativo na atividade policial são dois atributos que às vezes parecem ser inversamente proporcional no sistema de segurança pública.
Quer atuar como Justiceiro na vida real? Busque esse equilíbrio e se aproximará de ser um.
— * Sinval Batista é Agente de Polícia Federal, bacharel em Administração pela Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes, pós-graduando em Inteligência Competitiva e Contrainteligência Corporativa, e Representante Sindical.